Ilusão Dourada - Barbara Cartland - E-Book

Ilusão Dourada E-Book

Barbara Cartland

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Beschreibung

Linetta ficou sozinha no mundo, e a sua moribunda instrutora aconselhou-a a ir rumo a Paris e procurar a ajuda da sua sobrinha, Marie Blanche. Se aquela boa senhora, soubesse no que se tornara a sua queria Marie simples e de bom coração, agora crescida e brindando pelo demi-monde de Paris, amante de homens com o dobro de sua idade, teria sido o último lugar em que ela teria enviado Linetta! Mas as instruções dela foram conseguidas pela inocente e inexperiente Linetta , pois viu-se envolvida numa vida que a deslumbrou e confundiu… e o mais intrigante de tudo, era o plano de Marie para o futuro dela… que era aceitar a "proteção" de um homem idoso rico e generoso, mas Linetta tinha certeza de que esse plano teria desagradado a sua querida mãe. Mas quais as alternativas que ela tinha? Ela estava sozinha e sem dinheiro e não havia ninguém para ajudá-la a decidir o que fazer… deslumbrada com as luzes fulgurantes e a vida estonteante de Paris, Linetta estava vulnerável aos projetos de Blanche e seus amigos, mas, eis que pela segunda vez, surgiu em cena o Marquês para salvá-la!

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Seitenzahl: 184

Veröffentlichungsjahr: 2022

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ILUSÃO DOURADA

Barbara Cartland

Barbara Cartland Ebooks Ltd

Esta Edição © 2019

Título Original: “The Golden Illusion”

Direitos Reservados - Cartland Promotions 2019

NOTA DA AUTORA

Em 1899, arqueólogos franceses ativaram a aldeia de Delfos e, sob ela, descobriram as maravilhas da estátua de bronze O Auriga, o altar de Athena e muitas outras estátuas, além de frisas de incrível beleza.

Visitei Delfos em 1976, e constatei que o Templo de Apolo emanava uma estranha, extática serenidade, incapaz de ser descrita. Os Penhascos Cintilantes, erguendo-se por trás das colunas quebradas, como uma muralha protetora, encimam uma das mais admiráveis paisagens da Grécia.

Circundado de oliveiras, o Templo de Athena possui um encanto místico, inteiramente diverso do de qualquer outro templo que eu tenha visitado.

Em 1837, um historiador relatou que toda a Grécia estava infestada de salteadores, os quais o governo bávaro não conseguia controlar. Esta foi uma das causas da revolução de 1862, que derrubou o Rei Otho do trono.

CAPÍTULO I 1869

O Marquês de Darleston tomou um gole de champanhe.

O navio fazia a travessia Dover— Calais e o mar estava calmo.

Sentado na cabine de primeira classe, olhou para sua pasta e achou que era melhor passar o tempo lendo alguns dos documentos que o Primeiro-Ministro lhe havia dado.

Quando ia pegar a pasta, a porta se abriu e uma mulher entrou.

O Marquês ia dizer que a cabine era particular e que ela devia ter se enganado, mas viu seu rosto e percebeu que estava com medo e era muito jovem.

Notou também que era muito bonita.

—Peço… desculpa— disse a moça, ofegante—, será que posso ficar aqui por alguns momentos?

Enquanto falava, olhou por sobre o ombro, como se quisesse ter certeza de que a porta estava bem fechada.

—Há um homem… ele não… me deixa em paz.

O Marquês levantou.

—Sente. Vou cuidar dessa pessoa que está sendo desagradável.

Já se dirigia para a porta, mas a moça o deteve.

—Não... não, por favor. Não quero problemas. A culpa foi minha, de ter ido para o tombadilho, mas havia muita gente enjoando lá embaixo, embora o mar esteja bastante calmo.

—Vou lhe dar uma taça de champanhe. Você se sentirá melhor.

A desconhecida não protestou e ele pegou uma garrafa que estava num balde de gelo e serviu um pouco de champanhe. Virou-se para entregar-lhe a taça e confirmou sua primeira impressão: era mesmo bonita, muito bonita.

E se vestia de maneira muito simples e discreta.

—Não é possível que esteja viajando sozinha. Alguém a acompanha?

—Não há ninguém... comigo.

Pegou a taça e olhou-a, com ar dúbio.

—Nunca tomei champanhe. Mas mamãe sempre falava nessa bebida.

Achando que o Marquês esperava uma explicação, continuou:

—Minha mãe era francesa.

—Acho melhor nos apresentarmos. Sou o Marquês de Darleston.

—Sou Linetta Palaise.

—Muito prazer, mademoiselle Falaise— disse ele, com um sorriso que as mulheres achavam irresistível.

Linetta inclinou ligeiramente a cabeça, de um jeito muito gracioso. Talvez pelo fato de ser tão miúda, ela parecia pouco mais do que uma criança, e havia qualquer coisa de inocente no rostinho oval, de olhos muito grandes e nariz delicado e reto.

O Marquês achou que não parecia francesa, apesar de também não parecer inglesa. Os cabelos eram muito loiros; os olhos tinham um profundo tom cinza-azulado de um mar tempestuoso; os cílios escuros contrastavam com a pele clara.

Como se percebesse o que ele estava pensando, Linetta disse, com certo nervosismo:

—Minha mãe era da Normandia. Por isso tinha cabelos claros, o que é raro com as francesas, e meu pai também era loiro.

—Já esteve na França?

—Não.

—Mas agora vai ao encontro de seus parentes na Normandia?

—Não tenho parentes. Vou-me encontrar com... uma amiga, em Paris.

—Com certeza, ela está à sua espera, em Calais?

Linetta sacudiu a cabeça.

—Não. Tenho que me arranjar sozinha, mas estou certa de que... tudo dará certo, depois que eu chegar lá.

Mas havia em sua voz uma incerteza que não passou despercebida ao Marquês. Disse a si mesmo que não era de sua conta. Seria um erro se envolver na vida de uma estranha. Já bastavam as preocupações com a difícil tarefa que teria que desempenhar, quando chegasse a Paris.

Ao mesmo tempo, não podia deixar de sentir curiosidade a respeito de Linetta Falaise.

Não era tanto por ela ser muito atraente; era também, ao que lhe parecia— embora ele achasse isso absurdo—, porque havia nela alguma coisa diferente das outras mulheres que conhecia.

Ela tomou alguns goles de champanhe e disse:

—Mamãe tinha razão: sempre garantiu que champanhe tinha um gosto excitante, muito diferente dos outros vinhos.

—Você parece muito entendida no assunto!

Linetta ficou constrangida.

—Não quero parecer pretensiosa, mas mamãe era conhecedora de vinhos e me ensinou a escolher um bom vinho, embora raramente pudessemos tomar outra coisa, a não ser água.

Sorriu, como se fosse uma piada, e o Marquês achou que era um absurdo a moça estar viajando sozinha. Via-se claramente que se sentiria insultada pelas atenções de estranhos que achariam que uma mulher desacompanhada, principalmente uma tão bonita, era uma presa fácil.

—Por que é que você veio parar nesta cabine?

Linetta baixou os olhos e corou ligeiramente.

—Eu o vi subir a bordo, e achei que tinha uma aparência muito… distinta.

Hesitou e seu rubor se acentuou.

—Senti… de certo modo… que estaria segura com o senhor.

—Está absolutamente segura. Mas acho muito errado você fazer essa viagem a Paris, sem uma acompanhante.

—Sei muito bem que não é correto. Mas não havia nada que eu pudesse fazer sobre isto.

Linetta não pôde acreditar no que ouviu, quando a voz cansada de mademoiselle Antigny disse, num murmúrio:

—Estive pensando a seu respeito, querida. Terá que ir procurar minha sobrinha, em Paris. Não há outro lugar para você ir. Nenhum lugar!

—Mademoiselle, não fale desse jeito. Vai ficar boa! Tem que ficar!

Mas, mesmo falando com tanto ardor, sabia que não havia esperança.

Tinha visto o rosto do médico, ao sair do quarto de mademoiselle. Embora ele procurasse poupá-la, soube que a governanta que conhecia e amava desde criança estava morrendo.

—Há uma coisa que preciso lhe contar— disse mademoiselle Antigny, com um tremendo esforço.

—Não deve se cansar.

—Eu pretendia lhe contar isso há muito tempo. Mas adiava sempre, achando que não havia pressa. Agora, não tenho muito tempo mais.

Linetta apertou a mão da velha e inclinou a cabeça, para que mademoiselle não tivesse que falar alto.

—Depois que sua mãe morreu, há dois anos, a remessa do dinheiro que ela recebia foi interrompida.

—Foi interrompida!

—Chegou uma carta, dizendo que a remessa deixada por seu falecido pai seria suspensa. Pode encontrar a carta na gaveta do meio da minha escrivaninha.

Mademoiselle tinha feito um grande esforço para falar e estava quase sem fôlego.

—Então, que dinheiro estamos gastando?

—Minhas... economias...

—Oh, não, mademoiselle! Como é que pôde ser tão generosa, tão boa? Eu podia ter arranjado um emprego. Não deixaria que gastasse seu dinheiro comigo.

—De qualquer modo... seria seu... depois que eu morresse. Mas agora, meu bem... acabou! Depois que eu morrer, você deve vender tudo e com o dinheiro ir para Paris. Não tenho forças para escrever para minha sobrinha, mas, se você fizer a carta, eu assino.

—Como é que sabe que ela vai querer que eu vá?

—Marie-Ernestine é uma boa moça. Cuidará de você e lhe arranjará um emprego.

Perdeu o fôlego, e Linetta foi correndo buscar um comprimido e um copo d’água. O médico tinha dito que o remédio só devia ser tomado numa emergência. A governanta tomou o remédio e ficou durante alguns minutos de olhos fechados, recostada nos travesseiros.

Linetta pegou um papel de carta e um lápis. Achou melhor primeiro tomar nota das palavras da velha o mais rápido possível e depois copiar tudo, com calma.

Dali a momentos, mademoiselle Antigny abriu os olhos e disse:

—Como já lhe contei Linetta, minha sobrinha Marie-Ernestine, é uma boa moça. Ajudei a criá-la, até que a mãe a chamou… para ir ao encontro dela… em Paris.

Deu um suspirozinho:

—Pobre Marie-Ernestine! Ela se escondeu no sótão, desesperada, falando da escola do convento para onde tinha sido mandada por... um amigo da mãe. Desde essa época, escreveu-me todos os anos, no Natal.

—Sim, lembro que você ficava muito contente com as cartas dela.

—Marie-Ernestine deve ter encontrado um bom emprego em Paris. Não me disse o que é, mas a mãe costurava e fazia trabalhos domésticos para algumas famílias ricas. No último Natal, Marie-Ernestine me escreveu de um novo... endereço… na avenida de Friedland.

Mademoiselle Antigny fechou os olhos, como se estivesse esgotada.

—Escreva a carta... meu bem.

E Linetta obedeceu.

Depois da morte da velha e da venda da casa, a carta foi a única coisa que lhe deu uma sensação de segurança. Reconhecia que o conselho da governanta era sensato. Não podia viver sozinha. Disse a si mesma que, em Paris, Marie-Ernestine lhe arranjaria um emprego e que, pelo menos, ia ter uma amiga a quem pudesse recorrer num momento de dificuldade.

Parecia-lhe extraordinário que houvesse tão poucas pessoas em sua vida, que se centralizava na mãe e em mademoiselle.

Viviam muito isoladas na aldeia de Oakley, que ficava bem no interior. Uma diligência passava por lá duas vezes por semana, embora ninguém jamais descesse. Apenas raramente, um dos aldeões a tomava para ir a Oxford.

Linetta lembrava que a mãe nunca parecia querer ir a Oxford.

Na realidade, elas não precisavam de coisa alguma e tinham vivido satisfeitas na casa pequena, com o jardinzinho bonito do qual a Sra. Falaise cuidava sem o auxílio de um jardineiro.

Talvez seja pelo fato de ser francesa que mamãe conhece tão poucos ingleses, costumava dizer a si mesma, à medida que ia ficando mais velha.

Mas sabia que o verdadeiro motivo era a mãe não gostar de estranhos. Gostava de ficar sozinha, até que, quando Linetta tinha onze anos, a professora da menina, mademoiselle Antigny, veio morar com elas.

Era um arranjo satisfatório, porque mademoiselle, depois de ensinar os filhos de famílias nobres, da França e da Inglaterra, tinha se retirado para um minúsculo bangalô na aldeia, presente de seu último empregador.

Quando começou a dar aulas a Linetta, às vezes as antigas alunas vinham visitá-las. Eram agora jovens senhoras elegantes e sofisticadas, com maridos e filhos, que achavam divertido relembrar os velhos tempos. Mas, com o tempo, foram deixando de aparecer, e mademoiselle se sentia grata por ter a companhia da Sra. Falaise e os pequenos confortos de uma casa maior, que não existiam em seu minúsculo bangalô. A mãe de Linetta sempre falava em francês com a governanta, mas as duas faziam questão de que o inglês da garota também fosse perfeito.

—Seu pai era inglês— dizia a Sra. Falaise—, tinha uma voz muito bonita. Eu costumava dizer que, quando ele falava, era o mesmo que a gente ouvir música.

—Fale-me sobre papai— pedia a menina, muitas vezes, quando a mãe fazia essas observações.

No mesmo momento, tinha a impressão de que as lembranças eram penosas para a mãe.

—Ele morreu, Linetta!— dizia, com voz embargada.

Às vezes, levantava e saía da sala, como se tivesse medo de perder o controle diante da filha.

Na noite antes de partir para Paris, ainda na casa, Linetta olhou à volta e disse a si mesma:

—Este foi o meu mundo. Estou deixando tudo para trás.

As peças de mobília que a mãe tanto amava e que haviam parecido tão elegantes na sala tinham sido levadas embora. Renderam muito pouco, e até as estantes estavam vazias! Linetta achou que, mais do que qualquer outra coisa, gostaria de ter conservado os livros que haviam sido seus companheiros desde que aprendeu a ler. Mas eram pesados demais para levá-los para Paris. Mesmo assim, sentia remorso de estar levando tanta coisa.

Não que tivesse muitas roupas. Nunca houve dinheiro para coisas supérfluas. Guardou alguns pequenos objetos pessoais da mãe, as únicas lembranças de seu lar e de sua infância.

Em último lugar, foi até o cemitério visitar o túmulo da mãe. Sobre ele havia uma lápide muito simples. Linetta não estava em condições de encomendar coisa mais elaborada; apenas a pedra com a inscrição:

«Yvonne Leonide Falaise.

1832-1867»

«Onde é que papai estará enterrado?», pensou. A mãe nunca tinha lhe contado.

—Por que é que uso o sobrenome de mamãe?— perguntou à mademoiselle, quando estavam escolhendo a lápide.

—Não sei. Mas acho que ela amava tanto seu pai, que, quando ele morreu, não suportava falar nele ou usar seu nome.

—Mamãe o adorava!

—Ele deve ter sido uma pessoa excepcional, para inspirar tão grande amor.

Linetta tinha certeza disto.

Colocou no túmulo as flores que havia colhido de manhã, no jardim. Ajoelhou-se na grama fria e rezou para que mademoiselle, assim como sua mãe, estivessem no céu, juntas. Depois, rezou por si mesma.

—Por favor, meu Deus, olhai por mim e fazei com que nenhum mal me aconteça. Ajudai-me a ser boa e lembrar sempre as coisas que mamãe me ensinou. E ajudai-me a não ter medo.

Achou que, estivessem onde estivessem, a mãe e a governanta velariam por ela. O amor das duas por Linetta jamais morreria, como o dela também continuaria para sempre.

Apesar de tudo, foi difícil não ter medo, quando chegou o momento de tomar a diligência que a levaria na longa viagem até Dover.

Teve que trocar de diligência mais de uma vez, sempre temendo que sua bagagem se perdesse.

Fosse como fosse, e principalmente porque muitas pessoas se mostravam bondosas ao perceber que era uma viajante inexperiente, Linetta conseguiu chegar bem a Dover. Teve que esperar pouco tempo, até a partida do barco que atravessava o canal. Nunca tinha estado num navio antes, e achou-o grande e imponente.

O comissário lhe disse que descesse, e ela foi para um salão confortável, onde havia algumas senhoras e crianças pequenas. Assim que partiram, as crianças começaram a importunar e muitos passageiros ficaram enjoados. Linetta não via razão para isso. O navio jogava muito pouco; achou que a causa dos enjôos devia ser a tensão nervosa.

Querendo tomar ar e também conhecer o barco, subiu para o tombadilho.

Um homem com uma capa e um chapéu de tweed se aproximou dela. Percebeu logo, pela voz dele, que não era um cavalheiro. Mas respondeu-lhe educadamente, porque, pensou, a princípio, que apenas estivesse sendo amável.

O homem apontou para os rochedos de Dover, atrás deles, e disse quanto tempo o navio levaria para chegar a Calais, informando-a de que aquela era sua décima segunda visita à França.

Linetta procurou afastar-se, mas ele insistiu para que tomassem um drinque juntos.

—Se eu soubesse que ia encontrar uma criatura bonita como você a bordo, teria reservado uma cabine particular. Agora, estão todas ocupadas, mas vamos encontrar um lugarzinho confortável, protegido do vento.

Qualquer coisa na atitude dele fez com que Linetta sentisse medo.

—Preciso ir para baixo.

Mas o homem segurou-a pelo pulso.

—Vai ficar comigo, beleza. Temos muito que dizer um ao outro.

Passou o braço em volta da cintura dela, aproximando o rosto desagradável.

Linetta conseguiu-se libertar e correu pelo tombadilho. Ouviu os passos que a perseguiam e, apavorada, soube que não podia escapar por muito tempo...

Foi então que se lembrou do cavalheiro alto e distinto que tinha visto subir a bordo acompanhado por um criado particular e dois carregadores, que se transferiam do trem para o barco.

Linetta também tinha querido vir de trem, mas a viagem era muito mais cara do que de diligência. Por isso, observou com interesse os passageiros na estação da estrada de ferro. E nenhum chamou mais sua atenção do que o cavalheiro alto e distinto. Achou que era muito diferente dos homens que conhecia.

Ele lhe pareceu a encarnação de tudo que podia haver de belo num homem.

«Assim que meu pai devia ser», pensou.

A mãe pouco falava do marido. Durante todos aqueles anos, Linetta tinha criado mentalmente a imagem de um pai parecido com os heróis dos livros que lia tão avidamente. Tinha certeza de que havia sido como Ricardo Coração de Leão, segundo a descrição de Sir Walter Scott; como Jasão, em busca do Velocino de Ouro; como Davi, na escultura de Miguel Ângelo; e como todos os heróis de Shakespeare, resumidos num só.

Nunca chegou a imaginar realmente suas feições. Mas, quando observou o cavalheiro que agora sabia ser o Marquês de Darleston dirigir-se para o S. S. Victoria, disse a si mesma que seu pai devia ter sido parecido com ele.

Sentada ali na cabine, depois de ter tomado apenas uns golezinhos de champanhe, disse, como uma criança que lembra de repente das boas maneiras:

—Sou-lhe muito grata, senhor, por permitir que eu fique aqui. Deve achar que sou muito… sem cerimônia por ter vindo à sua cabine… mas eu não sabia o que fazer.

—Acho que agiu acertadamente, mademoiselle. Quando chegarmos a Calais, providenciarei para que fique num vagão reservado só para senhoras.

—Obrigada, senhor. Eu não sabia que havia esse tipo de vagão.

—Como já lhe disse, não devia viajar desacompanhada, mas, naturalmente, isso não é da minha conta. Procurarei fazer com que fique em segurança, até que seus amigos venham a seu encontro, em Paris.

Linetta ia dizer que ninguém iria esperá-la na estação, pois Marie-Ernestine Antigny, para quem levava uma carta de apresentação, não tinha a mínima ideia de sua chegada. Mas achou que podia parecer que queria que o Marquês ainda se ocupasse dela e ficou calada.

Quando chegasse à Gare du Nord, tomaria um carro, que ela sabia que se chamava voiture. Daria ao homem o endereço de Marie-Emestine e, depois disso, tudo daria certo.

Tinha uma fé ingênua em seus planos, nunca lhe ocorreu que Marie-Ernestine pudesse estar fora da cidade, ou que tivesse mudado de casa.

—O senhor é muito bom— disse ao Marquês, com uma expressão confiante que ele achou comovente.

Quando chegaram a Calais, acompanhou-a pessoalmente até o vagão onde se lia:

«Les Dames Seulement».

Foi depois para o luxuoso compartimento de primeira classe reservado para ele, achando que tinha feito o possível pela moça.

Enquanto aguardava a partida do trem, instalou-se confortavelmente, com a intenção de abrir sua pasta e examinar os documentos, o que não pôde fazer na travessia do canal.

Quando seu criado particular lhe trouxe uma cesta com o jantar ocorreu-lhe que Linetta não sabia que, se quisesse comer antes de chegar a Paris, teria que comprar comida na estação.

Com um impulso que o surpreendeu, mandou o criado comprar um lanche e uma garrafa de vinho branco e os levasse ao vagão onde a moça estava instalada.

Depois, abriu a pasta e disse a si mesmo que não queria saber de novas interrupções.

Ao receber o lanche, Linetta ficou surpresa e encantada.

—O Marquês achou que talvez a senhorita não soubesse que este trem é expresso e que só pára uma ou duas vezes durante a noite.

—Faça o favor de dizer ao Marquês que estou muito grata. Se ele não tivesse demonstrado tanta consideração, eu provavelmente chegaria a Paris morta de fome.

—Darei o recado, senhorita.

Linetta ficou sem saber se devia dar uma gorjeta ao homem. Parecia uma criatura tão superior, que teve medo de que fizesse pouco caso do que ela pudesse lhe oferecer.

Em vez disso, disse, com um sorriso:

—Obrigada a você também.

—De nada, senhorita— respondeu o criado, tirando o chapéu.

Linetta achou o compartimento de segunda classe muito confortável e teve sorte de só encontrar mais uma passageira, uma francesa de meia-idade que ia ao encontro do marido, transferido de um banco de Londres para Paris.

A mulher aceitou o vinho que a moça lhe ofereceu e retribuiu com uma xícara de café. Mostrou também como podiam esticar as pernas confortavelmente e dormir um pouco, já que não havia mais ninguém no compartimento.

Linetta estava tão cansada, que dormiu muito bem e nem viu o trem parar em Amiens. Só acordou quando sua companheira lhe disse que dali a meia hora chegariam a Paris.

—Alguém vai esperar você?

—Não, madame. Vou tomar uma voiture.

—Para onde?

—Vou para a Avenida de Friedland.

—Oh, que sorte! Vou para perto. Podemos tomar a mesma voiture. Fica mais barato.

Seguindo o conselho de sua nova amiga, Linetta pulou para a plataforma assim que o trem parou.

A francesa, mulher experiente, chamou logo um carregador para levar a bagagem. Como as duas não tinham perdido tempo, conseguiram uma voiture imediatamente.

Linetta pensou que, com isso, não teria chance de tomar a ver o Marquês ou de lhe agradecer a gentileza.

«Com certeza, já esqueceu de mim», pensou.

Gostaria muito de olhar para ele mais uma vez.

Era ainda bem cedo, e achou que o Marquês não iria se apressar; provavelmente, haveria uma carruagem particular à sua espera. Mesmo assim, olhou para trás pela última vez, com esperança de vê-lo na plataforma.

—Vamos indo— disse sua companheira, e Linetta a seguiu, sabendo que era ridículo ficar tão desapontada.

Tinha certeza de que jamais conheceria um homem tão bonito. No futuro, os heróis dos livros que ela lesse iriam todos se parecer com ele.

Havia tanta coisa para ver de Paris, que foi fácil esquecer o Marquês. Sentada na beirada do banco, olhava para as casas altas e cinzentas, que eram exatamente como sua mãe as descrevera.

As ruas de calçamento de pedra por onde passavam eram muito parecidas com as do passado, quando os aristocratas haviam sido levados para a guilhotina, pensou Linetta.

Cada pedra em Paris lembrava a história, uma história que ela não só havia estudado, mas sobre a qual lia avidamente e com prazer.

O Rei Sol, as intrigas de estadistas como Talleyrand, a ascensão e a queda de Napoleão Bonaparte…, parecia nunca encontrar livros suficientes a respeito de tudo isso, e agora estava vendo, com os próprios olhos.

Só quando chegou à avenida de Friendland, foi que sentiu medo. E se Marie-Ernestine Antigny não quisesse saber dela? Como é que se arranjaria, então?

Depois, achou que a moça devia ser exatamente como a tia a havia descrito: boa e cordial.

Como é que podia ser diferente, se, depois de tantos anos de separação, ainda lembrava da tia, quando chegava o Natal?

Mademoiselle Antigny sempre lia para Linetta as cartas da sobrinha, e agora desejou ter prestado mais atenção a elas. Nunca pareciam dizer muita coisa, nem descrever Paris.

«Sou muito feliz e estou passando bem! Penso muito em você, querida tia. Como eu gostaria que minha irmã Adelaide ainda estivesse viva, assim como meu irmão Zacharie!»

Linetta sabia que Marie-Ernestine, o irmão e a irmã eram filhos de Jules Antigny, um carpinteiro que tinha morado em Martizay, perto de Bourges. Sabia também que o carpinteiro havia abandonado a mulher e a família e fugido para Paris com uma jovem da localidade.

Para poder ir à sua procura, a esposa entregou os filhos a uma tia que morava em Mézières-Sur-Brenne e a uma outra que tinha a sorte de trabalhar como governanta num castelo da vizinhança.

Chegando a Paris, encontrou trabalho e mandou buscar a sua filha mais velha. Um dos homens para quem trabalhava, o Marquês de Gallifet, pagou pela educação de Marie-Ernestine, no Convent des Oiseaux.

Quando mademoiselle contou isso a Linetta, pareceu ser o suficiente para se saber sobre alguém. Mas agora, Linetta achou que era pouco e não lhe dava uma boa ideia de que espécie de pessoa era Marie-Ernestine.

Antes de sair da Inglaterra tinha calculado que ela devia estar com vinte e nove anos e que, portanto, há dezoito que não via a tia.

De repente, percebeu que nem mademoiselle poderia saber alguma coisa a respeito da sobrinha. Ficou apreensiva depois de se despedir da amiga do trem e se ver diante da escada do número onze, da avenida de Friedland, com a bagagem no chão, a seu lado.